sexta-feira, 23 de abril de 2010

No meio do caminho

Esses dias comemorei meu aniversário de quatro meses, exatamente a metade do meu contrato. O tempo passou tão rápido que nem acredito. Todo mundo no navio acha estranho quando eu digo isso, porque aqui as pessoas já começam a contar os dias pra ir embora no mesmo dia em que embarcam. É uma paranóia, todos ficam o tempo inteiro reclamando que o dia de ir pra casa não chega nunca. Mas, eu não. Há um boato de que existe uma data pra eu desembarcar com sete meses de contrato (isso é normal, o contrato é de oito meses que pode ser extendido ou reduzido em 30 dias), mas se isso acontecer penso em pedir para extender para oito. Porque eu realmente não tenho pressa de ir embora. Na verdade, eu não tenho pra onde voltar. Eu decidi embarcar no navio porque a vida não estava boa, não tinha trabalho nem dinheiro e estava sozinha. Então, não posso voltar pra uma vida que não é boa. Preciso e quero continuar a viagem que comecei, sempre pra frente, sem olhar para trás. Já tenho planos pra ir pra Salvador – BA, morar com meu irmão depois que acabar o segundo contrato. Se não acontecer nada de novo, é isso que vou fazer. Eu me sinto bem e forte aqui dentro, como nunca me senti na vida. Sei o que quero e como vou conseguir chegar lá. Mas, mesmo assim, de vez em quando eu fico pensando que é um pouco triste não ter uma casa, nem alguém esperando por mim no Brasil. Já não moro com meus pais há mais de dez anos, então a casa deles já não é mais a minha casa. Por isso, o tempo passa rápido para mim, porque estou sempre pensando em como vai ser o próximo porto e tentando descobrir pra onde estou indo. Quatro meses embarcada não é muito. Nem pouco. É só o meio do caminho.

Um pingo de melancolia

Ando meio carente andando pelos corredores de metal desse navio. Quatro meses atrás, embarquei decidida a não me envolver com ninguém pra não sofrer com as despedidas e com todas as dificuldades de ter um relacionamento a bordo. Pois é. Eu sempre consigo o que cumprir minhas promessas. Mas, está sendo muito difícil ser sozinha. Às vezes, cansa ser forte o tempo inteiro. Tem horas que morro de vontade de ter alguém pra ligar pra desejar boa noite, alguém pra assistir um filme, pra tomar café da manhã, pra descer do navio e passear. Tá difícil.

domingo, 11 de abril de 2010

Tenerife não é na Europa

Tive que comprar um mapa-múndi para descobrir que Santa Cruz de Tenerife, o primeiro porto onde o navio parou depois de sair do Brasil, não é na Europa. É só uma ilha que pertence à Espanha, perto da África. Na escola eu era melhor em física do que em geografia. Assim, descobri que ainda faltam dois dias de navegação para finalmente chegar em solo europeu.

Oásis no Deserto

Depois de uma travessia do atlântico filha-da-puta (levou 17 dias pra chegar na europa), só mesmo estar no Egito pra fazer as coisas valerem a pena. Nunca na minha vida imaginei que iria conhecer as pirâmides e passar pelas ruas de Alexandria. Pra falar bem a verdade, as pirâmides não foram tão emocionantes assim (correndo atrás dos passageiros pra tirar foto, nem deu tempo pra pensar em nada), mas conhecer tudo o que tem em volta foi fantástico. É engraçado que eu tinha a idéia de que as pirâmides eram coisas sagradas no meio do nada, que a gente tinha que ir até lá de camelo. Mas, elas ficam bem no meio da cidade, tem um pizza hutt em frente e um monte de hotéis em volta. O ônibus pára em frente da Esfinge e perto dos muros em volta é cheio de lixo que os turistas deixam. Foi isso que eu achei mais curioso. Fiquei olhando os prédios, as pessoas, a luz do sol que também é diferente em cada parte do mundo. Comprei a lembrancinha mais cara do mundo por 15 euros, é lógico que eu não ia sair do Egito sem que um árabe me passasse a perna. Mas, pelo menos eu comprei!

Fim de Festa

A temporada brasileira acabou no dia 17 de março, quando começou a travessia para a Europa. São dezessete dias de Santos/Brasil até Savona/Itália. Ainda faltam três dias para chegar na Europa e o clima dentro do navio é de completo “fim-de-festa”, porque a temporada européia é completamente diferente e a mudança é total. Uma grande parte dos brasileiros a bordo serão transferidos assim que o navio encostar na Itália e as despedidas já começaram. Para os que ainda aguardam definição, são dias angustiantes para saber se vai, quando vai e pra onde vai. De qualquer maneira, Savona é uma data importante para todo mundo, o início da temporada européia. Não sei o que vem pela frente, mas curti muito a temporada brasileira e já sinto saudade dos overnights em Buenos Aires. Muita coisa boa, nova e surpreendente aconteceu. Já ficou uma saudade do chocolate havana, do freddo, do tango, do alfajor, da música latina, do madagascar, dos cassinos, dos chicos lindos, do desayuno em puerto madero, das compras na florida, do leão marinho de punta del leste, da ilha em porto belo, da cerveja quilmes, de pegar táxi por cinco reais. Além disso, nesses três meses de Brasil/Argentina, muita coisa aconteceu dentro do meu mundo particular. Amores, amigos, família, trabalho. Daqui três dias, começa tudo de novo. Só que agora, não é mais só espanhol. É em espanhol, francês, inglês, italiano e alemão. Estou só esperando que as coisas continuem a acontecer.