segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

O tempo passa, o tempo voa

Pois é. Já faz dois meses que estou a bordo e agora que estou acostumada, as pessoas deixaram de ser monstros do mal e já consigo perceber que tem muita gente boa dentro do navio. O sistema é realmente bruto, mas é que nem a flor que nasce no asfalto. Durante o dia, tem umas coisas que me fazem sentir melhor e até me emocionam: um housekeeping passando de braço dado com um velhinha passageira, ajudando ela a achar a cabine; um amigo que pergunta se estou bem quando estou tomando água no crewmess pra me acalmar de uma briga com o chefe; um olhar de cumplicidade no tender lotado de hóspedes; um abraço de graça no meio do expediente; uma bala de chocolate quando a hora do break demora pra chegar; um celular tocando ragaton escondido na recepção de embarque, enquanto o chefe não vem; uma becks (sempre quente, que pena!) depois da noite de gala que é quando eu mais me ferro de trabalhar. Tem coisas que você só começa a dar valor quando está no meio do mar, dentro de um navio com mais de três mil pessoas e não pode sair quando quiser. Mas, no fundo, vale a pena.

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Lar Doce Lar

Até que o cafofo não é dos piores. Aliás, a cabine é ajeitadinha, só é pequena devido às circunstâncias, afinal estou morando dentro de um navio – é meio foda querer um duplex com sacada. Como fotógrafa, eu entro na categoria Staff e a gente não precisa limpar a cabine. Todo dia arrumam o quarto e trocam as toalhas. Isso está melhor do que na minha casa, onde eu tinha que faxinar pelo menos uma vez por semana. Eu tive sorte, minha cabine fica no final do corredor, por isso é totalmente sossegada, sem barulho nenhum. Também acho muito bom não ter que lavar a louça, já que faço as refeições no refeitório. Mas, sinto muito falta do pão francês que a gente sai de manhã pra comprar na padaria. Não estou me alimentando muito bem, estou bem sem apetite. Isso sempre acontece quando estou trabalhando muito. Hoje, comprei um Sustagen pra repor as vitaminas, estou me sentindo muito frágil, emagreci ainda mais e não quero ficar doente.
Assim, já me acostumei com a vida. Comprei livros do Deepak Chopra, do Luís Fernando Veríssimo e do Geofrey Blainey que ainda não comecei a ler. Também tenho uns seriados de sci-fi que gravei. Nesse próximo cruzeiro quero relaxar um pouco e fazer essas coisas mais simples do dia-a-dia. Estou precisando disso, às vezes sinto que estou perdendo um pouco minha identidade. Na verdade, eu não preciso de muito pra ser feliz. Ter meu cantinho, minhas coisinhas e um tempo pra pensar na vida, já é suficiente!

Calendário

Metade da temporada brasileira já se foi. Já fizemos cinco cruzeiros para Buenos Aires e temos mais cinco antes do navio fazer a travessia para a Europa. Eu ainda não sei se vou continuar no Magica, existe a possibilidade de remanejamento dos fotógrafos, afinal é uma equipe praticamente inteira só de brasileiros. Não acho que vai ser muito funcional na Europa. Eu gostaria muito mesmo de continuar, o itinerário é fantástico. Estou torcendo por isso. Por enquanto, os dias estão passando rápido para mim. Já me acostumei com os lugares. Buenos Aires e Punta já são parte da rotina e eu saio do navio já sabendo o que vou fazer. Em Buenos Aires, eu saio cedo pra comprar coisas na Florida, coisas do dia-a-dia como alfajor pra hora do break ou uma garrafa térmica pra poder fazer suco em pó. Depois, vou comer algo em algum lugar com internet wi-fi de graça pra poder ver emails e postar no blog. Às vezes, vou com alguém, mas geralmente vou sozinha. Lá pelas 15h eu volto pro navio e só trabalho às 19h. Em Punta, eu acordo cedo, pego o barquinho cheio de passageiros que sai no navio e deixa a gente no pier. Eu adoro, porque saindo do barquinho já estou na cidade, é só atravessar a rua e tem lojas, restaurantes, câmbio e internet wi-fi pra todo lado. Punta pra mim é uma Camboriu chique. É uma cidade de veraneio, com veleiros ancorados no pier, gaivotas voando, praia com faixa de areia larga cheia de guarda-sóis e turistas. A diferença é que é um lugar com pessoas mais velhas. Não tem som alto, não tem adolescente andando em grupo, não tem agito. É um lugar pra gente muito rica, uma coca e uma empanada custa 15 reais. A empanada é o equivalente uruguaio da nossa querida esfiha brasileira. Por isso, depois de pegar uma praia, eu como no Burguer King ou no McDonalds, já que é barato e eu adoro junkfood. Daí, mais um pouco de internet e volto pro navio logo depois de comer pra não pegar o barquinho lotado. São quinze minutos de barquinho e quando está lotado é um saco. Tem que ficar na fila e a gente corre o risco de chegar atrasado, tenho que estar dentro do navio até 15h30, é o horário limite pra tripulação, já que o navio parte às 17h. Todo mundo volta no último barquinho, mas como eu sou desesperada e odeio fazer as coisas com pressa, prefiro fazer desse jeito. Assim, ainda dá tempo de tomar um banho e tirar uma soneca antes de pegar pra trabalhar das 17h até meia-noite. Minha rotina é assim, a não ser nos dias navegação e de embarque de passageiros que eu trabalho de manhã e à noite. Porém, no navio nada é para sempre. Na Europa muda tudo outra vez. Por enquanto, é aproveitar a praia, os argentinos lindos, os overnights, os alfajores, as ofertas de casacos de couro, o sorvete Freddo, os cafés maravilhosos, as empanadas, os passeios pelas praças, a parrillada, o táxi barato, a internet wi-fi no meio da rua. Depois, novas paisagens me esperam.